quarta-feira, 25 de abril de 2012

A vida e suas surpresas…

….. e então ela voltou para casa, o lugar que deveria ser o abrigo seguro contra todos os males do mundo, já não podia protegê-la de si mesma, de seus desejos e pensamentos… chegou, com a boca seca, ofegante, fria e um pouco trêmula ainda, mesmo as atividades triviais não lhe desviavam a atenção do turbilhão que trazia na alma e no corpo…
Ele estava tão lindo!!! A blusa vermelha sinalizava um estado de espírito tão inquieto quanto o dela, saíam faíscas de ambos os olhares, havia um desejo contido em cada palavra, gesto e expressão…
Mas não havia espaço para manifestações, não havia lugar para expressões de carinho, senão apenas do olhar e sorriso…
Ela sentia o corpo enrijecido por sensações intensas, a alma vagava em torno sem saber onde restar… desfez-se do calçado molhado, do casaco pesado e subiu para o quarto na intenção vã de aplacar e fazer calar o que lhe gritava por dentro…
O corpo era frio, mas a alma incandescida não permitia que sentisse a temperatura real…
Deixou-se ficar em frente ao espelho, enquanto lembrava dos olhos, da boca, das mãos dele…
Ah, o que não dava agora para tê-las em si, não apenas por minutos contados, mas por um tempo sem tempo, mãos que deslizassem, quentes e macias, no corpo também assim quente e ávido daquele carinho…
Ah, o que não dava agora pelo beijo daquela boca, que só sabia dizer que também a queria, sem dizer uma só palavra sobre isso…
Ah, aqueles olhos que queimam e devassam, iluminando e perscrutando cada pedaço possível de ver…
Em tudo isso pensava, e quanto mais pensava, mais intenso ficava, não sentia frio, mas o corpo estava arrepiado… olhou-se outra vez no espelho…, tirou o vestido, as meias e depois as rendas que lhe realçavam o que ainda permanecia belo…
Deixou-se ficar assim alguns segundos, imaginando o quanto seriam felizes se pudessem realizar-se mutuamente…
Prendeu o cabelo, entrou no banheiro, ligou o chuveiro e, simplesmente, deixou que água quente aquecesse o corpo para igualar-se a alma, mas a alma não podia ser igualada, porque o calor que a invadira era muito superior ao calor que sua pele poderia suportar…
Fechou os olhos, tudo o que queria era reter aquelas imagens de momentos antes, o olhar, a boca, as mãos, infelizmente, não podia ter a sensação do cheiro, não pode alcançar a proximidade necessária para senti-lo, mas, intimamente, sabia que era bom, doce, e também quente, afinal já o experimentara em outra ocasião…
Finalmente, o corpo sedento cedia ao calor da água, suas próprias mãos se encarregavam de deslizar sobre si mesma…, não existe nada que já não saiba de si, o que não sabia era que ainda podia entregar-se com tanta intensidade à sensações que julgava adormecidas, e era isso… estavam adormecidas e agora despertavam, vibrantes e vigorosas como devem ser as sensações de prazer…
Como seria bom poder deslizar minhas mãos sobre aquele cabelo grisalho, tão lindo… tirar-lhe os óculos devagar e beijar cada recanto, cada beco, cada esquina e desvão, daquele rosto tão meigo, suave e belo…
De resto, havia silêncio, embora o coração agitado troasse como os acordes duma orquestra executando a 5ª Sinfonia de Beethoven…
Saiu do banho, o corpo agora estava mais leve, menos indócil, quase calmo…
Ligou o som, foi ouvir a 9ª Sinfonia, já estava mais alegre agora, pensava em tudo como se tivesse acordado recentemente de um sonho…
Vestiu-se sem as rendas de antes, sem o cuidado de antes, sem a expectativa de antes, voltara, aterrissara na vida normal, como se ainda pudesse voltar a ser normal, mas nada mais era como antes…
Abriu o computador conferiu a caixa de mensagens sabendo que não haveria nada de novo…
Contentou-se em reler as antigas mensagens, tão doces, tão cheias de ternura…
Perguntou-se: como pode ser? Como pode acontecer? Como? Como?...
sem resposta, apenas intuiu: é a vida e suas surpresas!!!

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