sábado, 28 de abril de 2012

Eros e Psique...

"Eu te confesso, Psiquê singela, esqueci as ordens de Vênus minha mãe,
que te queria cativa de imperiosa paixão pelo mais ínfimo dos miseráveis e condenada a uma abjeta união.
Fui eu, pelo contrário, que voei ao teu encontro, para ser o teu amante.
Era agir levianamente, eu sei.
O ilustre sagitário ferido com suas próprias flechas.
Afinal, fiz de ti minha mulher, para que me tomasses por uma besta monstruosa e tua mão cortasse com o ferro uma cabeça onde tu vês olhos que te adoram."
Apuleio, O Asno de Ouro, introdução, notas e tradução direta do latim de Ruth Guimarães, Rio de Janeiro, Edições de Ouro, s/d, p. 105-107. http://www.fflch.usp.br/dh/heros/traductiones/apuleio/asno/amordescoberto.html


... as mulheres da literatura, da mitologia, ou as silenciosas heroínas da história cotidiana trazem em algum ponto da sua jornada a marca da curiosidade... a curiosidade não é atributo, exclusivamente, feminino, mas os homens o dissimulam com maior habilidade...


... assim foi com Psique, com Pandora, com Arendt (sim, Hannah Arendt a filósofa... essa mesma!!!), Sabina Spielrein, ou Lizzy Bennet, e comigo e com muitas outras mulheres... que se deixam levar pela curiosidade da alma, do coração ou do corpo...


... Vênus ou Afrodite, a deusa com defeitos humanos (porque os gregos desconheciam a hipocrisia, ou não a praticavam tão descaradamente...), enciumou-se de Psique... pela beleza que inspirava aos homens ao seu redor... mandou o próprio filho castigar a mortal... foi Eros ou Cupido ferido mortalmente por sua seta de amor... e apaixonou-se, perdidamente, por Psique...


... Psique viveu durante muito tempo atormentada por uma beleza que a impedia de amar e de ser amada apenas como mulher e não venerada pela beleza que possuía...


...ela queria amar e queria ser amada... como qualquer mortal feminino ou masculino...


há algum tempo, escrevi esses versos talvez, inconscientemente inspirada pela mágica lenda de Eros e Psique, um amor quase impossível...


... há certa amargura neles... mas são parte de um momento... um importante momento... e os intitulei...


A estética da existência



De que serve uma existência
Que se volta para o melhor?


De que serve a excelência
Se o que a vida pede é muito menos?


De que serve cultivar o espírito
Se apenas o corpo desperta desejos?


De que serve tanto conhecimento
Se o que mais precisamos dali não pode ser extraído?


De que serve uma sensibilidade apurada
Se a fruição não pode ser alcançada?


De que serve a plena consciência
Se o sentimento não lhe deve obediência?


De que serve o domínio da paixão
Se o sofrimento há sempre de ser tão grande?


De que serve não permitir-se a compaixão
Se as forças se exaurem com o orgulho?


De que serve tanto aperfeiçoamento
Tanto dever, tanta dignidade moral


Se no final


Só resta o instinto animal...

out/2011





...


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